E Se o Próximo Papa For Negro?
Cristãos africanos há muito sonham com o dia em que a Igreja Católica terá um papa negro. Para muitos, esse momento seria símbolo de inclusão, representatividade e, sobretudo, um sonho ancestral realizado. Seria como ver, finalmente, a mãe África reconhecida espiritualmente no mais alto trono da cristandade.
Contudo, há camadas mais profundas que devem ser observadas com atenção e consciência. A história da humanidade, escrita em sua maioria pelos vencedores, retratou por séculos o povo africano como inferior, pecador, bárbaro e até mesmo como "amaldiçoado". Essa imagem distorcida atravessou os tempos e, infelizmente, ainda hoje persiste em discursos velados — ou mesmo evidentes — em várias esferas sociais, religiosas e culturais.
É nesse contexto que a possibilidade de um papa negro desperta não só esperanças, mas também medos, mitos e profecias. Um exemplo notório é a famosa "Profecia dos Papas", atribuída a São Malaquias. Segundo essa profecia, haveria 112 papas desde Celestino II (1143) até o fim dos tempos. Muitos estudiosos e numerologistas apontam que o Papa Francisco seria o último da lista. Segundo a tradição, após ele, viria um período de grandes tribulações espirituais, com a ascensão do chamado "falso profeta", um personagem que seria aliado do anticristo e instrumento da perdição.
É aqui que a reflexão se aprofunda.
E se esse próximo papa for africano? Negro?
O que para o povo africano pode simbolizar vitória, justiça e realização — para muitos que interpretam profecias de maneira literal, poderá ser sinal de alarme: a confirmação de que o "falso profeta" chegou. E, novamente, a imagem do negro será colocada como bode expiatório do mal, reforçando antigos estigmas enraizados na doutrina e no imaginário coletivo ocidental.
Povos de África, precisamos estar atentos.
Precisamos compreender o nosso papel neste século. Não podemos permitir que, mais uma vez, sejamos colocados como vilões da história que não escrevemos. É tempo de ocupação consciente dos espaços — seja na educação, na saúde, na política, no entretenimento ou mesmo nas mais altas esferas religiosas.
A presença de um papa negro deve ser motivo de orgulho, de avanço espiritual e de representatividade planetária. Mas também é um momento em que devemos ter maturidade, discernimento e firmeza para resistir às tentativas de vilanização da nossa identidade.
Hoje, os africanos não podem continuar apenas como espectadores da história. Devemos ser autores do nosso destino, com narrativas que nos representem de verdade — na arte, no ensino, na fé e nas instituições.
Seja quem for o próximo papa, que ele encontre em África um povo atento, desperto, organizado e espiritualmente fortalecido. Que a profecia se cumpra como semente de reflexão, não como sentença de medo.
A verdadeira libertação está na consciência. E a consciência começa pelo conhecimento da nossa história.
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