Angola: A Colônia Moderna? Silêncios, Patrimônio Roubado e a Falta de Soberania Cultural
Em pleno século XXI, Angola permanece como um exemplo claro de um país com raízes culturais profundas, mas com as mãos e a voz amarradas por laços herdados do passado colonial. A recente valorização das Ruínas de Mbanza Kongo como Patrimônio Mundial da UNESCO, embora inicialmente vista como um triunfo, levanta hoje questionamentos inquietantes: por que nosso patrimônio precisa de validação ocidental para ser respeitado?
A antiga capital do Reino do Kongo, um dos maiores impérios da África pré-colonial, tornou-se um símbolo gerido e promovido por organismos internacionais, enquanto os verdadeiros donos dessa história — o povo angolano — continuam distantes da sua plena posse simbólica e material.
Colonialismo Invisível: Quando a História Não Nos Pertence
Angola carrega cicatrizes profundas da colonização portuguesa, mas mais grave do que isso é o silêncio político diante do contínuo domínio simbólico do Ocidente sobre a nossa identidade.
Exemplos não faltam:
• Museus europeus ainda guardam milhares de artefatos angolanos roubados durante a era colonial. Máscaras, esculturas, documentos, joias reais, instrumentos rituais e outros elementos da cultura Bantu permanecem expostos na Europa como se fossem troféus de guerra.
• O símbolo português em frente ao Banco Nacional de Angola — uma espada, um brasão e inscrições portuguesas — permanece firme como se ainda estivéssemos sob domínio da coroa lusitana.
• Monumentos à figura do colonizador, enquanto líderes e heróis africanos como Kiwuka, Mutu ya Kevela ou Mandume são negligenciados na memória pública.
• O Museu Nacional de História Militar, localizado na antiga Fortaleza de São Miguel, continua a exaltar as vitórias portuguesas, mesmo sendo hoje um espaço angolano.
• A Fortaleza de São Pedro da Barra, local de aprisionamento de angolanos escravizados, segue abandonada e sem ressignificação africana.
• Falta de um plano nacional de repatriação dos artefatos históricos, enquanto países como a Nigéria, Etiópia e Egito já estão há anos em campanhas ativas para resgatar seus bens culturais.
Uma Angola Silenciosa Enquanto a África Desperta
Países como Burkina Faso, sob a liderança firme de Ibrahim Traoré, decidiram dizer “basta” ao neocolonialismo. Com apoio de Mali e Níger, construíram uma nova identidade africana, orgulhosa e resistente.
Namíbia recusou acordos exploratórios com grandes potências, preferindo proteger os recursos naturais em nome das gerações futuras.
África do Sul, com sua diplomacia ativa, desafia constantemente o poder ocidental nas Nações Unidas, no comércio internacional e até no Tribunal Penal Internacional, defendendo os interesses africanos sem hesitar.
Enquanto isso, Angola permanece calada. Calada diante da pilhagem cultural. Calada diante da imposição de valores estrangeiros. Calada até mesmo perante a fome, a miséria e o desemprego, enquanto os contratos com multinacionais continuam a beneficiar apenas elites e estrangeiros.
Onde Está o Plano para Libertar o Espírito Angolano?
O povo angolano precisa de mais do que discursos de independência comemorados uma vez por ano. Precisamos de:
1. Um programa nacional para o resgate de artefatos históricos roubados.
2. A remoção ou ressignificação de símbolos coloniais em espaços públicos.
3. Um reposicionamento diplomático africano que se inspire na coragem de Burkina Faso, Namíbia e África do Sul.
4. Investimento na reeducação histórica da juventude angolana, promovendo heróis locais e identidades ancestrais.
5. Criação de novos museus e centros culturais africanos, administrados por africanos, contando histórias africanas, para africanos.
Conclusão: Quem Está no Comando da Nossa Identidade?
Angola tem tudo para ser um centro cultural e espiritual do renascimento africano. Mas enquanto os líderes continuarem a agir como gestores de interesses coloniais, o país seguirá submisso, com um povo sem identidade, sem memória e sem direção.
Não basta celebrar Mbanza Kongo como patrimônio mundial, é preciso reocupar esse espaço com consciência africana. Precisamos de uma Angola que resgata o que lhe foi roubado, que reescreve sua própria história, e que, acima de tudo, se levanta sem medo diante do Ocidente.
O tempo de submissão terminou. O povo angolano merece líderes com coragem ancestral.
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